Outros,
entre os quais o JPMorgan, atrevem-se a prever expansão abaixo de 1% do
PIB da região em 2009 e recessões em países como Argentina e México,
com retrações de 1% e 0,6%, respectivamente.
Quaisquer que sejam os prognósticos, está claro que a bonança macroeconômica dos últimos anos acabou. Nem todos, contudo, compartem a mesma sorte em 2009: embora muitos possam crescer a passo de tartaruga, como Brasil e Colômbia (2% e 2,5%, respectivamente, segundo o JP Morgan), outros continuarão nas alturas, com taxas de expansão ainda elevadas, como o Peru (5,3%).
Da mesma forma, nem todos os setores serão afetados por igual e, sem dúvida, a região conservará um importante potencial, em particular para operadores em busca de mercados amplos: as economias latino-americanas com renda per capita superior aos US$ 10 mil, em Paridade do Poder de Compra (considerado como limite para o desenvolvimento da classe média), agrupam quase 400 milhões de pessoas, 75% da população da região.
Neste ano, uma das incógnitas para a região será a Ásia, particularmente a China. Para alguns países da região, como o Chile, por exemplo, a Ásia já é a principal região de destino de suas exportações (35% das exportações chilenas dirigem-se para a Ásia, mais do que para a América do Norte e Europa). No Peru, a porcentagem é de 19% e outros países, como o Brasil e Argentina, também olham cada vez mais para o Pacífico.
Desde 1995, o intercâmbio comercial entre América Latina e Caribe com a China multiplicou-se por 13, de US$ 8,4 bilhões para US$ 100 bilhões em 2007. No ano passado, a China transformou-se no segundo maior parceiro comercial da região, logo atrás dos EUA. Como se fosse pouco, os preços das matérias-primas, que representam mais de 60% do total das exportações latino americanas, dependem em parte da demanda asiática, com a China devorando petróleo, cobre e soja para sustentar seus índices de crescimento e fornecer alimentos à população.
A China, em 2008, 30 anos após o processo de abertura iniciado por Deng Xiaoping, converteu-se na terceira maior economia do mundo. Desde o fim do ano passado, a taxa de expansão perdeu força e as autoridades anunciaram um plano maciço de estímulo fiscal (US$ 600 bilhões, cerca de 14% do PIB). Para a América Latina, todos acontecimentos no distante Oriente serão igualmente cruciais.
Tudo aponta para uma rápida desaceleração na China, não apenas pela cifra agregada, mas também pelas contrações setoriais que estamos presenciando. A demanda por aço, o consumo elétrico, as vendas de carros e a produção industrial apontam para uma baixa. As medidas adotadas, contudo, também corroboram a determinação das autoridades de manter o crescimento acima de 7% a 8%, considerado por muitos analistas como chave para inibir distúrbios sociais e descontrole do desemprego.
Os desafios chineses, entretanto, vão mais além da conjuntura. Como nenhum outro país emergente, a China depara-se a médio prazo com o repto de não apenas uma, mas de três transições demográficas de grande calado.
Não apenas precisa enfrentar uma urbanização acelerada de sua população, mas também o envelhecimento acelerado (deste ponto de vista sua "idade de ouro" demográfica já passou, ao contrário da Índia) e a um descompasso de gênero sinalizando que o equivalente à população da Espanha não encontrará parceira no futuro. Em breve, haverá entre 40 milhões e 60 milhões de homens a mais do que mulheres, como consequência da política de natalidade levada a cabo nas décadas anteriores.
Outro desafio, mais estrutural, enfrentado pela economia da China são as tensões e tentações protecionistas que irão conquistar espaço no Ocidente à medida que a recessão se aprofunde em 2009.
Como assinalado no magnífico ensaio do economista Yasheng Huang, "Capitalism with Chinese characteristics: entrepreneurship and the State" ("Capitalismo com Características Chinesas: Empreendedorismo e o Estado"), o capitalismo chinês padece de um pecado original, que reside em seu controle estatal. Este cordão umbilical, embora constitua uma de suas forças, também expõe estas mesmas empresas a reações adversas no momento de entrar em outros mercados, especialmente via aquisições ou aumento das exportações.
No futuro, é de se esperar que este desafio protecionista, longe de atenuar-se, fique ainda mais acentuado. É algo que as empresas sul-coreanas e japonesas, que no passado apostaram em grandes investimentos na China, estão antecipando, como é corroborado por seus recentes desdobramentos industriais e avanço em outros mercados asiáticos, como Vietnã e Indonésia, o que é uma forma de diversificar seus riscos e não se expor demasiado a um breque às importações chinesas por parte dos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Os riscos aqui assinalados, a curto e longo prazo, não têm motivos para materializar-se no futuro. O que, sim, é certo, tanto para o bem como para o mal, é que a América Latina terá que considerar o que ocorrer ou deixar de ocorrer na Ásia, em particular na China. Os vínculos entre as duas regiões continuarão cada vez mais próximos. Isto é algo que fica claro para ambas as regiões, como simbolizaram, no fim de 2008, a entrada da China no Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), como país doador; a celebração da 2ª Cúpula Empresarial China-América Latina, na cidade chinesa de Harbin, província de Heilongjiang; e a presença, alguns meses antes, em Lima, do primeiro-ministro da China na cúpula do Fórum de Cooperação Econômica da Ásia-Pacífico (Apec, em inglês).
Nesta ocasião, o governo peruano assinou acordo de livre comércio com o colosso asiático, depois de tê-lo feito com o Chile em 2005. Atualmente, a Costa Rica também negocia acordo similar, e é de se esperar que mais países façam o mesmo.
A crise atual, desencadeada nos países da OCDE, apenas confirma a necessidade de olhar em direção a novos rumos, algo que América Latina e China vêm fazendo, de maneira acertada, desde o princípio do milênio.
Javier Santiso
Javier Santiso é diretor e economista-chefe do Centro de Desenvolvimento da OCDE, instituição que publica o Panorama Econômico Latino-Americano da OCDE.